terça-feira, março 27, 2007

Dia Mundial do Teatro

All the world's a stage,
And all the men and women merely players:
They have their exits and their entrances;
And one man in his time plays many parts,
His acts being seven ages.

William Shakespeare

segunda-feira, março 26, 2007

Prata da casa

Quem visita a nossa Escola, quem a frequenta diariamente, dela faz a sua vida e a ela devota os seus dias, conhece, sem qualquer dúvida, a D. Lucinda. A portaria está nas suas mãos uma parte do tempo e é ela quem nos recebe, a ela também a quem damos os bons-dias, e é também a D. Lucinda que, por vezes, chama a atenção de quem se esquece de passar o cartão da escola ou de quem lhe é menos cortês, infelizmente. A maior parte de quem lá passa desconhecerá, porém, que por trás da candura e paciência está uma poetisa. Hoje deixo-vos com um passeio por Mafra, mais uma vez a propósito. Não só os escritores de renome têm algo a dizer sobre Mafra. Quem cá vive há tanto tempo tem uma opinião igualmente digna de ser ouvida. É, por isso, com grande prazer que aqui dou a conhecer a veia poética da nossa D. Lucinda. Aproveitem!

Passeio a Mafra

I
Fui passear a Mafra
Para ver sua beleza
Meu olhar ficou atento
Ao admirar o Convento
Com tamanha grandeza

II
Fui ver a sua tapada
Cheia de vegetação
Com animais à mistura
Ainda bem que perdura
Aquela boa criação.

III
Segui p´ra Vila Velha
Passeio que fiz a pé
P´las Tecedeiras desci
As muralhas descobri
E a Igreja de Santo André.

IV
Vi a Quinta da Cerca
E o seu Palácio velhinho
Vi um relógio de sol
Um a fazer pão mole
Vi de tudo um bocadinho.

V
Dei um salto ao miradouro
Dali tudo se avista
Vi moinhos a rodar
Gado lindo a pastar
E os galos com sua crista.

VI
Segui p´lo Jardim do Cerco
Sua estufa admirei
Vi num lago muitos peixinhos
Perto dali passarinhos
Da nora imponente gostei.

VII
Abram os olhos Mafrenses
Vejam se se enchem de capricho
Preservai a Natureza
Sem ela não há beleza
Não sujem Mafra de lixo.

Maria Lucinda Santos

sexta-feira, março 23, 2007

Memória por trás do livro

E agora que o Convento e a Basílica estão nomeados para uma das Sete Maravilhas de Portugal, aqui fica um excerto de como nasceu a obra que faz viajantes, turistas, professores e alunos deslocarem-se cada vez mais a Mafra:

Um dia, aproxidamente por esta mesma época, fui de excursionista a Mafra. Tinha nascido na Azinhaga, vivia em Lisboa, e agora, quem sabe se por um cúmplice aceno dos fados, uma piscadela de olhos que então ninguém poderia decifrar, levavam-me a conhecer o lugar onde, mais de cinquenta anos depois, se decidiria, de maneira definitiva, o meu futuro como escritor. Não recordo que os Baratas tivessem ido connosco. Tenho mesmo a ideia vaga de que nos levou de automóvel um conhecido qualquer de meu pai que, tanto quanto sei, não deixou outro sinal de passagem nas nossas vidas. Dessa breve viagem (não entrámos no convento, apenas visitámos a basílica) não guardo mais viva lembrança que a de uma estátua de S. Bartolomeu colocada, e aí continua, na segunda capela do lado esquerdo de quem entra, a que chamam, creio, em linguagem litúrgica, o lado do Evangelho. Andando eu, pela minha pouca idade, tão falto de informação sobre o mundo das estátuas e sendo a luz que havia na capela tão escassa, o mais provável seria que não me tivesse apercebido de que o desgraçado Bartolomeu estava esfolado se não fosse a parlenga do guia e a eloquência complacente do seu gesto ao apontar as pregas de pele flácida (ainda que de mármore) que o pobre martirizado sustinha nas suas próprias mãos. Um horror. No Memorial do Convento não se fala de S. Bartolomeu, mas é bem possível que a recordação daquele angustioso instante estivesse à espreita na minha cabeça quando, aí pelo ano de 1980 ou 1981, contemplando uma vez mais a pesada mole do palácio e as torres da basílica, disse às pessoas que me acompanhavam: «Um dia gostaria de meter isto dentro de um romance.» Não juro, digo só que é possível.

José Saramago, As Pequenas Memórias, Caminho. pp 77-79

S. Bartolomeu, Basílica do Palácio Nacional de Mafra
foto: minha

quarta-feira, março 21, 2007

E porque...

ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!

É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e cetim…
É condensar o mundo num só grito!
(...)

comemora-se hoje o Dia Mundial da Poesia.
Aqui fazemos uma viagem pela poesia de outras latitudes...
Preparados?
poema de Florbela Espanca

Além do Bojador

Grito Negro

Eu sou carvão
E tu arrancas-me brutalmente do chão
e fazes-me tua mina, patrão.
Eu sou carvão!
E tu acendes-me, patrão,
para te servir eternamente como força motriz
mas eternamente não, patrão.
Eu sou carvão
e tenho que arder sim;
queimar tudo com a força da minha combustão.
Eu sou carvão;
tenho que arder na exploração
arder até às cinzas da maldição
arder vivo como alcatrão, meu irmão,
até não ser mais a tua mina, patrão.
Eu sou carvão.
Tenho que arder
Queimar tudo com o fogo da minha
combustão.
Sim!
Eu sou o teu carvão, patrão

José Craveirinha

Outras margens

»essa palavra margem«
quem primeiro domesticou a palavra margem foi guimarães rosa.

depois foi invadido por marés de margens...
depois pode-se apontar
margem de rio
margem da página
margem do momento [ou momento à margem]
margem-só
terceira margem [do rio, das pessoas, do amor]
poeta à margem
poesia das margens
margem de gente
à margem da vida
vidas sem margem
ficas sem margem
na margem da vida
margem de vinda
margem de ida
margens de chegada [com canoas, jangadas, embarcações]
margem adiada
margem odiada
margens dos cegos, dos gagos
a margem dos que estão
à margem dos que não estão
margem da liberdade [de pisar o chão]
à margem da verdade
margem da lágrima
minha margem
na margem
do meu poema.

[a terceira margem da pessoa – é o outro...?]

Ondjaki

Para lá dos Andes

NO TE QUIERO sino porque te quiero
y de quererte a no quererte llego
y de esperarte cuando no te espero
pasa mi corazón del frío al fuego.

Te quiero sólo porque a ti te quiero,
te odio sin fin, y odiándote te ruego,
y la medida de mi amor viajero
es no verte y amarte como un ciego.

Tal vez consumirá la luz de enero,
su rayo cruel, mi corazón entero,
robándome la llave del sosiego.

En esta historia sólo yo me muero
y moriré de amor porque te quiero,
porque te quiero, amor, a sangre y fuego.

Pablo Neruda

Do lado de baixo do Equador

Memória

Amar o perdido
deixa confundido
este coração.

Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.

As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão.

Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão.

Carlos Drummond de Andrade

foto: minha

Do umbigo

o teu sono anoiteceu mais que a noite
e hei-de escrever-te sempre sem que nunca
te escreva sei as palavras que fechaste
nos olhos mas não sei as letras de as dizer
ensina-me de novo se ensinares-me for
ir ter contigo ao teu sorriso ensina-me
a nascer para onde dormes que me perco
tantas vezes numa noite demasiado pequena
para o teu sono num silêncio demasiado fundo
dormes e tento levantar a pedra que te
cobre maior que a noite o peso da pedra que
te cobre e tento encontrar-te mais uma vez
nas palavras que te dizem só para mim
o teu sono anoiteceu mais que as mortes
que posso suportar e hei-de escrever-te
sempre e mais uma vez sozinho nesta noite

José Luís Peixoto

segunda-feira, março 19, 2007

Vida leva eu

A tarde aconchegava-se no regaço da noite. Entre cariocas e turistas, caipirinhas saboreadas à porta dos bares ou nas janelas para o outro lado do casario encavalitado, e souvenirs acabados de adquirir nas lojas para o efeito, um bulício miudinho instalava-se em Santa Tereza. A hora anunciava o regresso.
Do outro lado da rua, numa pequena praça, um táxi largava turistas e de turistas se havia de ocupar de novo, quando atravessámos a rua e lhe pedimos que nos levasse ladeiras abaixo até Ipanema na Zona Sul. O trajecto escolhido seria um pouco mais longo, mas certamente com menos trânsito. Confiar em taxistas pode ser um risco, mas pode também abrir janelas do desconhecido.
Cosme Velho, no sopé do caminho, morro acima, que levaria ao Corcovado e que dias antes percorrêramos. Detive-me na paisagem, embrenhada na Mata Atlântica com o perfume da clorofila densa a entrar pela janela aberta do táxi. Lá dentro, a conversa começara a girar ao ritmo tranquilo da tarde que se escondia. Portugueses? Sim, portugueses. Sei que terei dito como era única aquela cidade, mesmo não me lembrando de o ter feito. Quem algum dia viu o Rio de Janeiro a seus pés jamais recuperará de tanta beleza e sei que teria no rosto o sorriso pateta de quem se deixa absorver por essa beleza insondável instalada na alma para ficar até ao último dia de memória. O taxista sorriu, feliz pelo elogio, habituado, contudo, a ele.
Seria Domingo e dia de Fla-Flu. O Maracanã estaria então a esvaziar-se após o clássico dos clássicos não muito longe dali. Mesmo quem não gosta de futebol sabe que Fla-Flu é Fla-Flu. No rádio, ainda os resquícios do jogo. O resultado? Um empate talvez. À saída do túnel Rebouças, a conversa soltara-se desinibida. E quais dos brasileiros estavam jogando em Portugal? Liedson, por exemplo. Não, esse não conheço não. Luisão? Sim, claro. E Felipão, o gaúcho teimoso que impôs sua vontade mas trouxe o título para casa em 2002, estava agora ao serviço de Portugal.
A tarde cada vez menos nítida e lá fora a brisa suave de Março, misturada com uma humidade perfumada e o linguajar doce desse português do Brasil, musical e carinhoso. E ao atravessarmos a cidade, de repente com a Lagoa Rodrigo de Freitas em frente, a conversa escorregou para a festa de recepção dos pentacampeões no Rio que o taxista relatava com emoção potenciada pela alma brasileira e a paixão pelo futebol. Isso aqui tava assim de gente… e continuava O senhor não conhece? Zeca Pagodinho? O nome não era de todo estranho, também a propósito da Copa do Mundo e da obstinação de Scolari ao preterir todos os afamados cantores brasileiros por um simples pagodeiro que pelo sonho ajudara a levar o país à vitória, surgira algures numa conversa passada. A melodia absolutamente desconhecida, porém. E o taxista, mais convincente que qualquer outro guia de viagem credenciado, cantou-nos Confesso que sou de origem pobre, meu coração é nobre, foi assim que deus me fez…Deixa a vida me levar. Vida leva eu. Deixa a vida me levar… Conhece agora? E continuava cantando Vida leva eu… Naquele táxi atravessando a cidade talhada entre morros, céu e mar, surgiu mais um hino para a banda sonora da cidade maravilhosa, sem o brilhantismo de outros compositores, igualmente genuíno e autêntico. Nada como deixar a vida nos levar.

Leonor Barros ©

quinta-feira, março 15, 2007

Parabéns, António Lobo Antunes!

Eis também a razão pela qual António Lobo Antunes não visitará este humilde cantinho para receber as nossas felicitações pelo maior Prémio de Língua Portuguesa que lhe foi atribuído:

No que me diz respeito não sei mexer num único desses símbolos do progresso, do aspirador ao apara-lápis, do micro-ondas ao blequendéquer, do vídeo ao saca--rolhas que levanta a pouco e pouco duas pérfidas asinhas de metal. Afasto-me dos telemóveis como da peste, faço largos círculos para não passar perto de uma calculadora de bolso. O isqueiro do esquentador assusta--me com as suas rápidas, instantâneas chamazinhas azuis, o trepidar da máquina de lavar loiça provoca-me suores de vítima, de lenço amarrado na cara, de pelotão de execução. E tenho conseguido somar anos, apesar dos aparelhos, graças a uma prudência maníaca e a uma cautela de cego, até que surgiram os computadores.
Julgo não ter medo da morte, não ter medo do dentista, não ter medo da lepra, não ter medo dos políticos, mas tenho medo dos computadores. Tenho medo da sua falsa inocência, da sua submissão aparente, da sua eficácia tenebrosa, do seu ódio silencioso e vesgo. Já me engoliram um romance inteiro, já me transformaram capítulos em poesia experimental, já retiraram ossos aos meus parágrafos, reduzindo-os a um puré de adjectivos. Por isso escrevo à mão. Escrevo à mão para que os erros sejam meus e as personagens iguais às da minha cabeça e não resultado da imaginação delirante e asséptica de uma disquete esquizofrénica, inventando situações desconfortáveis e aberrantes como as dos sonhos das gripes. E os computadores imagino-os rugindo numa jaula de circo, sonolentos e de unhas de fora, só possíveis de enfrentar de botas altas, alamares e chicote na mão, obedecendo a contragosto às ordens de quem se aproxima deles, tocando-lhes com um pau para os obrigar à complicada proeza de uma frase escorreita.


in "Os Computadores e Eu"
António Lobo Antunes, (1996), Crónicas, Círculo de Leitores.

Para ler mais, nada como requisitar um livro do António Lobo Antunes no nosso Centro de Recursos. Recomendo os livros de Crónicas e Os Cus de Judas para iniciados e antes de se abalançarem prosa dentro.

quarta-feira, março 14, 2007

terça-feira, março 13, 2007

Primavera


Pensar uma flor é vê-la e cheirá-la
E comer um fruto é saber-lhe o sentido.

Alberto Caeiro, Poemas
foto: minha

segunda-feira, março 12, 2007

Notícias

A semana passada foi recheada de iniciativas aqui na Escola, também por isso, a minha ausência aqui no blogue.
No dia sete comemorou-se o Dia da Escola. Logo pela manhã iniciaram-se as actividades que envolveram os alunos e o Departamento de Informática. Ainda pela manhã eu, a professora Paula Costa e a professora Alice Carvalho com a colaboração de alunos de várias turmas demos a provar mais uma vez os sabores britânicos e das nossas mãos surgiram scones, deliciosos, diz quem provou. À tarde, o professor Adriano Alcântara deu uma palestra no Auditório da Escola sobre a poesia moçambicana de expressão portuguesa, com uma contextualização fundamental para a compreensão da poesia e prosa lusófonas, e levou-nos a viajar além-mares com música e fotografia. Uma triangulação perfeita. Entretanto, os alunos da Escola Básica Hélia Correia fizeram também uma visita à nossa Escola.
E eis que chega oito de Março. Numa iniciativa deste Centro de Recursos, o Dr. Manuel Gândra deslocou-se à nossa Escola para dar um colóquio em torno do Monumento de Mafra, bem a propósito, uma vez que o Monumento está nomeado para uma das Maravilhas de Portugal. Oito de Março foi também o Dia Internacional da Mulher. Houve poemas e bonbons para não deixar a data em vão, numa iniciativa também do Centro de Recursos. Ufa, tanta coisa! Espero que nada tenha ficado de fora.

terça-feira, março 06, 2007

Parabéns, Gabo!

Hoje estamos aqui para felicitar Gabriel García Márquez. O Patriarca entrou no seu Outono e comemora 80 anos de vida. Nascido na Colômbia, em 1927, em Aracataca, onde se terá inspirado para escrever alguns dos seus romances, Gabriel García Márquez é o nome mais emblemático do realismo mágico e autor de uma obra ímpar reconhecida pela Academia Sueca em 1982. Assume-se como caribenho, uma identidade mais vasta do que as fronteiras físicas podem impor e que o caracteriza inequivocamente.
Este ano de 2007 será um ano pleno de datas comemorativas para Gabo, assim é carinhosamente conhecido no mundo hispânico e fora dele. Comemorar-se-ão vinte e cinco anos de lhe ter sido atribuído o Prémio Nobel da Literatura e, em Junho, quarenta anos terão decorrido sobre a publicação do romance, Cem Anos de Solidão, talvez o mais conhecido de toda a sua obra.
Diagnosticado com cancro em 1999, Gabo começou a escrever as suas memórias, publicadas em 2003, Viver para Contá-la, e publicou posteriormente, em 2004, uma novela, Memórias das minhas Putas Tristes, a história de uma ancião a braços com a solidão e o amor. Olhos de Cão Azul é o último livro recentemente publicado no nosso país. O seu 80º aniversário foi amplamente celebrado no mundo latino.

segunda-feira, março 05, 2007

Feira do Livro

Realizou-se na semana passada, entre os dias vinte e oito de Fevereiro e três de Março, a primeira Feira do Livro organizada pela Associação de Estudantes da Escola. O Centro de Recursos não foi alheio à iniciativa e prestou o seu apoio. Durante quatro dias houve livros para todos os gostos de vinte editoras diferentes. A Feira esteve aberta não só à comunidade escolar mas também a toda a comunidade em geral e, a acompanhar a iniciativa, tiveram lugar quatro palestras, a cargo dos professores Adriano Alcântara, António Abreu e Ismael Gonçalves e do Dr. Artur Franco Henriques. O tempo não se mostrou muito cooperante no primeiro dia, é certo, mas tudo vale a pena para que a leitura se torne um hábito tão intuitivo como tantas outras tarefas que fazemos no quotidiano e que se revelam essenciais para o nosso equilíbrio. Que a iniciativa se repita e sempre com sucesso.

imagem: Gabriele Münter