sábado, dezembro 17, 2011

segunda-feira, novembro 28, 2011

Parabéns, Eunice Muñoz!

Setenta anos de carreira são razão de sobra para comemoração da vida e do talento de um nome grande do teatro.

fotografia de Margarida Dias

sábado, setembro 10, 2011

segunda-feira, setembro 05, 2011

Freddie Mercury



A música vive e nela a alma de quem a criou.
A um dos génios da música no dia em que faria 65 anos.

segunda-feira, agosto 22, 2011

Receita de Leitura (28)

Dose de Amostra
A minha estação de metro chama-se Patriotismo. Também há estações chamadas Ninos Heroes ou Constitución de 1917, além, claro, das que têm o nome de algum figurão desde os aztecas (Cuauhtémoc, Guerrero, Hidalgo, Juárez, Pino Suárez...). Os nomes mexicanos de ruas, cidades ou estações são, em si, patrióticos. E depois as estações como esta têm bancas de fritos e índios de chinelos.
Então desço as escadas, como se descesse ao submundo dos aztecas de agora, os incontáveis milhões que percorrem todos os dias as entranhas da cidade e, quando a corrente espessa e quente me apanha, deixo-me ir, sem pé. Um místico chamaria a isto o êxtase da dissolução. A humanidade a convergir por baixo da terra, pele com pele. Aqui faz calor e a religião não tapa. Os mexicanos têm muito corpo, sempre a sobrar.
E há ventoinhas que nos borrifam com água. Os letreiros são dos anos 70, descomunais. As bichas para os bilhetes desfazem-se num ápice. Cada viagem custa 18 cêntimos, e é porque aumentou este ano. O cais reluz de limpo, parece interminável e em menos de dois minutos fica repleto.
Nunca me senti tão alta entre tantas cabeças escuras, índios ou misturados de índios: os pobres. Só tenho uma palavra, e repito-a atónita, porque não me lembro de ter sido levada assim de enxurrada por um país. Comovente. O México é comovente. Se alguém falar comigo agora desato a chorar.

Alexandra Lucas Coelho, (2010), Viva México, Lisboa, Tinta-da-China.

Composição
Viva México é o relato vívido mas fiel de uma viagem ao país de Moctezuma e Zapata, Frida Kahlo e Diego Rivera, entre Junho e Julho de 2010. Ao longo de quase um mês, Alexandra Lucas Coelho, jornalista do jornal ‘Público’, percorreu o território mexicano, da Cidade do México ao Iucatão, passando por Ciudad Juárez e Oaxaca, e deixa-nos uma prosa escorreita e apaixonante.

Indicações
Recomenda-se Viva México a turistas e viajantes e a todos os amantes de uma boa viagem além-fronteiras. Os apaixonados por destinos distantes experimentaram melhoras evidentes no seu estado sombrio de humor invernoso. Viva México é muito bem tolerado por indivíduos curiosos por outras culturas e outros países e que não se satisfazem com as primeiras impressões apressadas de um país.

Precauções
Foram reportados casos de ligeira irritação em leitores à procura de paraísos estereotipados de coqueiros e mares esmeralda. Viva México mostra uma outra realidade e ultrapassa o cliché de margaritas e mariachi. Indivíduos sugestionáveis registaram episódios leves de ansiedade pelo apelo de um mundo distante e uma história fascinante e foram vistos a fazer as malas rumo à aventura. Suspenda a leitura por instantes, mas não desista. A privação de boas prosas pode causar síndrome de abstinência e levar o leitor a actos desesperados como tentar ler o livro do vizinho nos transportes públicos ou os primeiros folhetos publicitários que encontrar.

Outras apresentações
Se gostou da escrita de Alexandra Lucas Coelho, experimente um outro livro de viagens nesta mesma colecção, O Caderno Afegão. Se é amante de literatura de viagens aventure-se nos outros livros desta colecção e adentre o Japão, Nova Iorque ou Veneza. Viajar pode ser a distância entre o virar de páginas e o sonho. Leia sempre. Viaje mais.

Um boa leitura de férias!

sábado, julho 23, 2011

Feminino e intemporal

A voz inversamente proporcional à figura excessivamente magra, o cabelo armado com um penteado a que Nicolau Tolentino não ficaria indiferente, beehive, chamam-lhe, Karl Lagerfeld já o lhe teceu comentários elogiosos, considerando-a um ícone do estilo, o corpo esquálido enfiado num vestido que habitualmente lhe sobra, as pernas esguias e finas sobre sapatos de salto alto e a sensação de que os passos sobre os saltos são tão instáveis e periclitantes como o caminho que vai trilhando pela vida pessoal e profissional. E de Amy Winehouse já muito se disse, ou não nos brindasse a estrela que se teme subitamente cadente, com uma verdadeira novela em torno da sua vida pessoal, um enredo trágico prenhe de drogas e álcool, escândalos e amores sofridos, destemperos e hedonismos, conflitos familiares e problemas conjugais que se fundem e forjam as letras de que são feitas as suas canções, particularmente em Back to Black, o segundo trabalho que lhe valeu seis nomeações para os Grammys e que lhe fez arrecadar cinco. Recentemente a sua figura consta entre os notáveis do Museu de Cera mais famoso do mundo, o Madame Tussaud’s em Londres e em Maio último viu a letra de Love is a losing game ser objecto de análise nos exames de Cambridge. Muito, portanto, para uma mulher de apenas 24 anos. Com cinco milhões de cópias, apenas do último CD, vendidas em todo o mundo e um sucesso retumbante e ascensão meteórica, a frágil e jovem diva espalha e desperdiça o talento e divide o mundo entre críticos e solidários, puritanos e admiradores, uma panóplia de adivinhadores da desgraça tal como acontece no site em que são feitas previsões sobre a morte da cantora e uma imensidão de vaticinadores do infortúnio. Amy é tudo menos consenso e se consenso se lhe aplica tem lugar num único ponto: o talento de que a belíssima voz é parte imprescindível. Esqueçamos então a figura controversa, a imagem da mulher desalinhada e desesperada que exibe em palco a tragédia da sua própria vida, patética e decadente, e ouçamos apenas a voz portentosa. Esqueçamos também o seu percurso pessoal e ouçamos o que tem para nos dizer. Love is a losing game, por exemplo, é um hino às adversidades do amor, Back to black, o lamento da perda e do amor infeliz, Wake up alone, a solidão que se abate como o sol poente no quotidiano, Tears dry on their own, um tema perfeito para as mulheres que já experimentaram as lágrimas secar por si, muitas de nós, acredito. Há mais em Amy do que apenas Amy. Existe um sentimento muito feminino, intemporal e transversal de perda, solidão e rejeição. Quanto de nós não é Amy também?

Crónica escrita há uns anos e republicada hoje em jeito de homenagem a  Amy Winehouse que nos deixou hoje

segunda-feira, julho 18, 2011

Happy Birthday, Madiba!


I learned that courage was not the absence of fear, but the triumph over it. The brave man is not he who does not feel afraid, but he who conquers that fear.
Nelson Mandela

No 93º aniversário de uma das figuras incontornáveis dos nossos tempos, provavelmente de todos os tempos.

segunda-feira, maio 09, 2011

Torre de Babel

Numa praça no centro de Buenos Aires foi erigida uma Torre de Babel com livros. Tem 25 metros de altura e é composta por 30 mil livros. A iniciativa, a cargo da artista argentina Marta Minujin, tem como objectivo 'unir todas as raças do mundo'. Buenos Aires é a Capital Mundial do Livro 2011, proclamada pela UNESCO.  No últinmo dia em que a iniciativa estará patente ao público, a 28 de Maio, os livros poderão ser levados para casa. Basta escolher a língua e o título. Pena Buenos Aires ficar tão longe...

segunda-feira, abril 25, 2011

25 de Abril

Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo

Sophia de Mello Breyner Andresen

segunda-feira, março 21, 2011

Dia Mundial da Poesia (7)

A hora da partida

A hora da partida soa quando
Escurecem o jardim e o vento passa,
Estala o chão e as portas batem, quando
A noite cada nó em si deslaça.
A hora da partida soa quando
As árvores parecem inspiradas
Como se tudo nelas germinasse.

Soa quando no fundo dos espelhos
Me é estranha e longínqua a minha face
E de mim se desprende a minha vida.

Sophia de Mello Breyner Andresen

Dia Mundial da Poesia (6)

Ausência

Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.

Carlos Drummond de Andrade

Dia Mundial da Poesia (5)

E ao anoitecer

e ao anoitecer adquires nome de ilha ou de vulcão
deixas viver sobre a pele uma criança de lume
e na fria lava da noite ensinas ao corpo
a paciência o amor o abandono das palavras
o silêncio
e a difícil arte da melancolia

Al Berto


Dia Mundial da Poesia (4)

Sábado encarcerado

Para ti que és o sangue e o sorriso
Ventre de mar e concha de silêncio
Para ti que és a ilha sem navios
Porto de brisa azul sem juramento

Para ti, minha imagem de proa
Meu Sábado de sol e carícia
Nesta tumba de grades que interrogam
Hora a hora para ti sustenho a vida.

Urbano Tavares Rodrigues

Dia Mundial da Poesia (3)

Encantamento

há uma palavra mágica que se diz. essa palavra
é sempre diferente. montanha, precipício, brilho.
essa palavra pode ser um olhar. a voz. um olhar.

essa palavra pode ser o espaço de silêncio onde
não se disse uma palavra. brilho,             , montanha.
essa palavra pode ser uma palavra, qualquer palavra.

há uma palavra mágica que se diz. há um momento,
depois dessa palavra, só depois dessa palavra,
pode começar o amor.

José Luis Peixoto

Dia Mundial da Poesia (2)

deserto em mim
paz e aceitação.

lamas e cicatrizes
mistérios e pactos
inscritos a fogo
no terreno sagrado da mão.
apago-o
incenso na carne:
um cigarro não me matará

os seus dias
o seu peso
talvez.

Ondjaki

Dia Mundial da Poesia (1)

fast forward

Por muito
que aceleres

- duas vezes,
quatro vezes -

nunca deixas
de ter pressa.


José Mário Silva

segunda-feira, fevereiro 28, 2011

And the Oscar goes to...


Um filme intenso e um papel soberbo. Absolutamente merecido.

World Book Night

Está mesmo aí a chegar uma iniciativa que será a total loucura para os amantes de livros e da leitura. Será no próximo dia, 5 de março, no Reino Unido e Irlanda. Cerca de 20.000 adoradores deste objecto precioso que guarda letras e universos irão oferecer 1 milhão de livros. A iniciativa é levada a cabo pelas editoras, livreiros, autores e bibliotecários e tem o apoio de figuras proeminentes como Colin Firth, J. K. Rowling, Nigella Lawson, Seamus Heaney e David Gilmour. Consultem aqui os livros que vão ser oferecidos. Recomendo desde já Beloved de Toni Morrison, Toast de Nigel Slater e The curious incident of the dog in the night-time de Mark Haddon.
E pronto, já sabem, dia 5 de Março, irei desejar ardentemente estar no Reino Unido, pode ser Londres, Oxford ou Edimburgo. Importante esra mesmo estar. Enquanto me fico por este desejo, vou esperando que por cá se leve a cabo uma iniciativa semelhante.

domingo, fevereiro 27, 2011

Moacyr Scliar

O escritor gaúcho Moacyr Scliar deixou hoje de luto as letras brasileiras e a literatura de expressão portuguesa. Quando os escritores nos deixam, ficam as obras, mas permancerá o vazio de não haver mais livros por aquela mão. Universos que se apagam.

Notícia da morte de Moacyr Scliar e site do escritor

segunda-feira, fevereiro 21, 2011

Correntes d' Escritas

Já na sua 12ª edição está aí mesmo a chegar o Correntes d'Escritas, o encontro de escritores de expressão que já começa a ser tradição depois de uma dúzia de anos. O evento é promovido pela Câmara Municipal da Póvoa do Varzim e irá ter lugar de 23 a 26 deste mês de Fevereiro. Abrange uma vasta gama de acontecimentos que serão o deleite dos amantes da literatura: debates, lançamentos de livros, sessões de poesia, concursos, atribuição de prémios e mesas redondas. Dos livros que vão ser lançados, dois chamaram-me a atenção: Havana, ano zero de Karla Suárez e Última Paragem: Massamá de Pedro Vieira. Aqui fico à espera, cheia de pena de a Póvoa do Varzim ser tão longe.

segunda-feira, fevereiro 14, 2011

Dia de S.Valentim (10)



Love is faith.

Dia de S. Valentim (9) - Receita de Leitura

Dose de Amostra
Qualquer que tivesse sido a nossa diversão na noite anterior, por mais tarde que tivéssemos chegado e por mais que eu tivesse bebido, pela manhã, mal a luz surgia por entre as lâminas das persianas, projectando no tecto estranhos reflexos das ondas do Bósforo, eu levantava-me e subia as persianas, e de todas as vezes ficava maravilhado com a quase explosão de beleza que entrava pela janela. Para meu espanto, sentia aquele enlevo que apenas surge com um reacordar, com a descoberta das belezas esquecidas da vida — pelo menos, eu assim queria acreditar. A sempre perspicaz Sibel, apercebendo-se do meu estado de espírito, vinha pôr-se ao meu lado, vestida com a sua camisa de noite de seda, e as tábuas do soalho rangiam ligeiramente sob os seus pés, e juntos admirávamos a beleza do Bósforo, o barco de pesca vermelho que o atravessava, sacudido pelas ondas, a névoa que se erguia acima das colinas sombrias e cheias de árvores da outra margem e a forma como o primeiro ferry-boat da manhã se inclinava ao cortar a corrente, assobiando como um fantasma.

Orhan Pamuk, (2010), O Museu da Inocência, Lisboa, Editorial Presença.


Composição
Kemal, um jovem de Istambul proveniente de uma família abastada, apaixona-se perdidamente por Füsün, uma jovem de origens sociais humildes e não muito bem aceite pela sociedade istambulense de finais dos anos setenta. O Museu da Inocência não é apenas mais um livro sobre o amor, contudo. Nele encontram-se décadas de vida turca a braços com alterações sociais e políticas, um verdadeiro roteiro por Istambul, um catálogo do museu com os inúmeros objectos coleccionados por Kemal ao longo de décadas e uma elegia ao sentimento turco de nostalgia, hüzün.

Indicações
Recomenda-se a leitura d’ O Museu da Inocência aos amantes de prosas longas e interessados pela História e cultura de um povo. Amantes de viagens e cidades exóticas experimentaram sensações de bem-estar ao encontrar-se numa das mais vibrantes cidades europeias, Istambul. Indivíduos com tendência para o coleccionismo regozijaram ao identificar-se com Kemal. Leitores obcecados pelos objectos quotidianos como testemunho do tempo leram O Museu da Inocência com entusiasmo.

Precauções
Em leitores românticos foram observadas pontualmente alterações do ritmo cardíaco e lágrimas teimosas indiscretas pelo amor sofrido de Kemal e Füsun. Viajantes intrépidos sentiram ansiedade em alguns capítulos. O ímpeto de procurar o passaporte e aventurar-se na senda do verdadeiro Museu da Inocência em Istambul, cuja abertura se adivinha para este ano de 2011, foi um dos efeitos secundários reportados. Os amantes de mapas foram vistos a localizar a ficção na cidade de Istambul. Descontinue a leitura apenas por uns momentos. Resista por agora ao apelo do Bósforo mas não desista.

Outras apresentações
Orhan Pamuk, Prémio Nobel da Literatura em 2006, tem uma vasta obra, Aventure-se pois para novas experiências em Istambul, Memórias de uma Cidade. Caso prefira ficção, entre em Uma Vida Nova, o livro que granjeou muito êxito a Pamuk na Turquia e que deixa o leitor sem fôlego.

Dia de S. Valentim (8)

liegen, bei dir

ich liege bei dir, deine arme
halten mich, deine arme
halten mehr als ich bin.
deine arme halten, was ich bin
wenn ich bei dir liege und
deine arme mich halten.

Dia de S. Valentim (7)

Conta a história que Bono terá escrito esta canção para a mulher, Alison, para se redimir por não ter estado presente no dia do seu aniversário. E quem resiste a uma bela declaração de amor?

Dia de S. Valentim (6)

Dia de S. Valentim (5)

Flowers
 
Some men never think of it.
You did. You’d come along
And say you’d nearly brought me flowers
But something had gone wrong.

The shop was closed. Or you had doubts —
The sort that minds like ours
Dream up incessantly. You thought
I might not want your flowers.

It made me smile and hug you then.
Now I can only smile.
But, look, the flowers you nearly brought
Have lasted all this while.

Dia de S. Valentim (4)

'Les Amoureux au Vence', Marc Chagall

Dia de S. Valentim (3)

As verdadeiras canções de amor são eternas.

Dia de S. Valentim (2)

Tinha um cravo no meu balcão;
veio um rapaz e pediu-mo
- mãe, dou-lho ou não?

Sentada, bordava um lenço de mão;
veio um rapaz e pediu-mo
- mãe, dou-lho ou não?

Dei um cravo e dei um lenço,
só não dei o coração;
mas se o rapaz mo pedir
- mãe, dou-lho ou não?

Eugénio de Andrade

Dia de S. Valentim (1)

segunda-feira, fevereiro 07, 2011

Bob Marley

Com um dia de atraso, é certo, mas não podia deixar de homenagear aqui o homem, cantor e compositor que inspirou gerações e que continua a ser ouvido. Bob Marley, o profeta do reggae, teria completado ontem, dia 6 de Fevereiro, sessenta e seis anos, caso a morte não o tivesse ceifado tão cedo.
Happy Birthday, Bob, wherever you are!


quarta-feira, fevereiro 02, 2011

Ler barato (8)

A colecção "Frente e Verso" da revista "Visão" tem por esta altura a sua segunda série nas bancas. São mais sete escritores lusófonos e os livros têm prosa e poesia. O primeiro livro de Alice Vieira foi grátis e saiu em Janeiro. Seguem-se José Jorge Letria, Luísa Dacosta, Urbano Tavares Rodrigues, Natália Correia, José Mário Silva e Ana Paula Tavares. O preço é uma agradabilíssima surpresa, apenas cinquenta cêntimos. Mesmo com austeridade não há razão para não ler.

sexta-feira, janeiro 07, 2011

Receita de Leitura (26)

Dose de Amostra
-Acha que alguma vez poderemos passar sem carvão, petróleo e gás? — perguntou, abafando um bocejo.
Aldous ia a contornar uma rotunda gigantesca, tão grande e movimentada como um circuito de corridas, que os impelia centrifugamente para um acesso à auto-estrada, para o meio do rugido redobrado dos veículos que passavam, dos camiões do tamanho de cinco vivendas, a zunirem em fila em direcção a Bristol a cento e vinte quilómetros à hora e de todos os outros veículos em fila para os ultrapassar. Exactamente assim — quanto mais tempo poderia isto continuar? Beard, enfraquecido e frágil devido à insónia, sentiu-se diminuído. A M4 demonstrava uma paixão pela vida de que ele já não era capaz. Era a favor das estradas secundárias, trilhos para carroças, carreiros. Encolhido dentro do seu casaco Harris de tweed, ouvia Tom Aldous, que falava com a segurança de um aluno de quadro de honra a dar as respostas que pensa saber que o professor quer.
— O carvão e, mais tarde, o petróleo contribuíram para o nosso progresso, mas agora sabemos que queimar essas matérias nos vai destruir. Precisamos de um combustível diferente para não nos afundarmos. Trata-se de outra revolução industrial. E não há alternativa: o futuro é a electricidade e o hidrogénio, as únicas duas fontes de energia que sabemos serem limpas.

Ian McEwan, (2010) Solar, Lisboa, Gradiva.

Composição
Michael Beard, Prémio Nobel da Física, mulherengo inveterado, conformado na vida e inconformado com a velhice que lhe bate à porta, vê-se envolvido num projecto para combater o aquecimento global e onde a fotossíntese artificial e a energia solar surgem como caminhos a seguir. Menos solar do que as propostas que apresenta para salvar o planeta, a vida pessoal de Michael Beard proporciona-lhe situações inusitadas e espelha a complexidade das relações humanas.

Indicações
Solar é recomendado a todos os leitores e aos apreciadores de Ian McEwan em especial. O escritor não desilude com esta obra inédita de preocupações ambientais. Indivíduos preocupados com o planeta e o aquecimento global observaram sensações quase tão luminosas como o título do livro. Amantes de viagens experimentaram francas melhorias com o deambular de Michael Beard entre o gélido Árctico e o escaldante deserto do Novo México. Solar é geralmente bem tolerado pela maioria dos leitores.

Precauções
Leitores à procura de super-heróis não devem ler este livro sob pena de se desiludirem. Michael Beard está longe de ser perfeito e de incorporar a estatura moral e ética dos heróis clássicos e de se comportar de acordo com os cânones morais. Solar pode provocar sentimentos contraditórios em homens e mulheres de ciência. Foram reportados casos de ira extrema perante a alternativa pouco credível de Beard e pela forma pouco honesta como atraiçoou o jovem Tom Aldous. Noutros indivíduos observaram-se manifestações de júbilo perante a alternativa proposta.

Outras apresentações
Se gostou de Solar aventure-se e experimente outras obras deste escritor britânico: Amesterdão, Expiação, Sábado e Na Praia de Chesil. Longe das preocupações ambientais, as restantes obras versam sobre a complexidão das relações humanas e não desiludem. Ler é um bálsamo. Dirija-se à Biblioteca da nossa Escola e leia mais. Leia sempre.

quarta-feira, janeiro 05, 2011

Feliz Ano Novo

Mão grado as perspectivas menos positivas, um novo ano está aqui para fazermos dele o que bem entendermos. Como uma agenda com todas as páginas por escrever ou um caderno em branco, completemos 2011 com palavras e rabiscos de optimismo e esperança. Ergamos a cabeça para que 2011 não nos derrote.

quinta-feira, dezembro 23, 2010

quinta-feira, dezembro 16, 2010

terça-feira, dezembro 07, 2010

Es weihnachtet

Não gosto de chuva. Não gosto de tempo cinzento. Não gosto de vento. Não gosto de frio. Odeio Inverno. Contudo, quando pela primeira vez fui ao mercado de Natal em Munique, no ano seguinte ao de Budapeste, depois ao de Praga e no ano a seguir ao de Viena, a minha vida mudou e passei a saber apreciar a vida estranha de uma encasacada entre iluminações, tendas de artesanato, anjos e coroas de flores secas aromatizadas com laranja, canela e cravinho e uma caneca de Glühwein, escaldante e perfumado, titubeantemente aconchegada entre as mãos gélidas, enganosamente cobertas de luvas invernosas. E não há sol nem calor. Há uma magia oculta, quem sabe reminiscências de Natais passados e felizes, no calcorrear de ruelas estreitas que sossobram às barraquinhas coloridas e decoradas com cuidado, a nuvem de ar espesso e branco que se eleva das verbalizações quase monossilábicas dos vendedores, conversa apenas no indispensável para que ocorram pequenas trocas comerciais, o dinheiro contado na palma da mão enluvada, rostos brilhantes encafuados em gorros pungentes e o pescoço envolto no carinho aconchegante de um cachecol volumoso, um obrigado e um adeus. A luz estridente que se propaga no contraste das noites precoces e assustadoramente negras de um Dezembro final, aromas que se desprendem das mais diversas iguarias, o restolhar mansinho dos passos vagarosos e da roupa volumosa dos transeuntes e o bater de perna mercado acima e abaixo sempre acompanhado da constatação tão óbvia do frio omnipresente. Estranhos prazeres para uma alma estival. Doce contradição. 

 Praga
fotografia minha